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NEPOL UFJF

São Carlos contra a Covid-19

Victor Cezar Rodrigues


Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política


Universidade Federal de São Carlos


O município de São Carlos está localizado no interior do estado de São Paulo a aproximadamente 230 km de distância da capital paulista. A cidade é conhecida como a “capital da tecnologia”, devido à concentração de empresas de alta tecnologia, elevado número de doutores, estudantes universitários e centros de pesquisa de excelência na produção cientifica com os campi da Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

Segundo dados do IBGE 1 , o município apresenta uma população de 221.950 habitantes tendo, pelo menos, 28 mil habitantes com 60 anos de idade ou mais, grupos considerados de risco pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na pandemia da Covid-19. Ainda de acordo com os dados do IBGE, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do município é de 0,805, o que coloca a cidade de São Carlos em 14º no ranking do estado de São Paulo e 28º entre as cidades brasileiras. O atual prefeito da cidade é o empresário Airton Garcia Ferreira que foi eleito em 2016 pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e, posteriormente, mudou para o Partido Social Liberal (PSL).

A primeira ação oficial da administração municipal foi o Decreto Nº 115 do dia 14 de março de 2020 que determinou a suspensão de eventos, reuniões e encontros promovidos pela administração pelo prazo de 10 dias. O referido decreto recomendou a avaliação da pertinência da realização de eventos de massa promovidos pelo setor privado, assim como a suspensão da emissão de novos alvarás para realização de eventos de qualquer natureza.

As instituições educacionais no município foram afetadas rapidamente por decretos e resoluções. A secretaria municipal de educação seguiu as determinações e o cronograma proposto pelo decreto estadual Nº 64.862 que estabeleceu um período de adaptação e de orientações educacionais entre 16 e 20 de março e a suspensão das aulas por tempo indeterminado a partir do dia 23. O decreto também orientou que a rede privada adotasse as mesmas medidas. O conselho de Reitores das Universidade Estaduais Paulistas (CRUESP) determinou a suspensão das aulas presencias a partir do dia 17 de março, o que afetou os dois campi da USP existentes em São Carlos. A UFSCar suspendeu suas aulas em todas as unidades a partir do dia 16 de março, através da portaria Nº 4371, como medida preventiva e temporária para reduzir a exposição e a circulação da comunidade acadêmica aos riscos do coronavírus.

No dia 17 de março, em sessão na Câmara Municipal de São Carlos, os vereadores manifestaram preocupação com a situação da saúde no município2. Segundo o vereador Elton Carvalho (PSB), membro da comissão de saúde, o município não apresenta capacidade suficiente para atender pacientes em estado grave que necessitem de respiradores mecânicos. Um levantamento realizado com membros da secretaria de saúde revelou que a Santa Casa do município apresentava apenas 30 leitos de UTI, quantidade considerada insuficiente.

Essas primeiras ações de prevenção foram coordenadas com as orientações e decretos do governo estadual e ocorreram antes da confirmação de casos na cidade. A vigilância epidemiológica de São Carlos confirmou o primeiro caso de Covid-19 no dia 18/03, um homem de 35 anos notificado pela rede privada. Neste mesmo boletim, o município contabilizava um total de 25 casos suspeitos e 4 casos descartados.

As medidas anteriores representaram o primeiro passo na tentativa de reduzir a quantidade de pessoas em circulação no município. Mas foi a partir dos decretos municipais Nº 1203 e Nº 1404 publicados nos dias 19 e 20 de março, respectivamente, que as restrições foram expandidas para todos os serviços e atividades consideradas não prioritárias para o enfrentamento da pandemia. Nesses decretos ficou estabelecido o fechamento do comércio, de bares, escritórios e quaisquer outros estabelecimentos que estimulem ou proporcionem atividades, aglomeração e circulação de pessoas no período de 20 de março a 30 de abril.

O decreto centralizou e modificou os atendimentos essenciais de alguns serviços da área social como o Bolsa Família, cadastro único, benefícios assistenciais e prevenção à violência doméstica. A prefeitura disponibilizou novo local para o alojamento noturno de pessoas em situação de rua, a partir do dia 24 de março, e para a proteção e a conscientização em relação aos riscos eminentes da Covid-19. A distribuidora de energia do Estado suspendeu os cortes no fornecimento de energia por falta de pagamento por um período de 90 dias para residências de famílias baixa renda e serviços essenciais.

Nove dias após a confirmação do primeiro caso de Covid-19 em São Carlos, a vigilância epidemiológica do município confirmou o segundo caso da doença no dia 27 de março. Os números da pandemia são contabilizados a partir das notificações das unidades de saúde da prefeitura, Hospital Universitário da UFSCar, Santa Casa, rede particular e convênios. No boletim epidemiológico desse dia, o município contabilizava 51 casos suspeitos, 24 casos suspeitos em internação, 2 casos confirmados, 7 casos descartados, 4 óbitos em investigação e 482 casos em isolamento domiciliar (síndrome gripal)5 .

No dia 27 de março, o comitê emergencial de combate ao coronavírus reuniu autoridades e representantes de vários seguimentos – sindicato do comércio, associação comercial e industrial, médicos da rede pública e privada entre outras categorias – para reavaliar alguns pontos do decreto que determinou o fechamento do comércio. A decisão tomada foi a manutenção do decreto até o dia 7 de abril, coincidindo com a data limite do decreto de quarentena do Estado. Após essa data o comitê irá se reunir para definir a continuidade ou não do fechamento do comércio em São Carlos, com base nas avaliações técnicas da situação da doença na cidade.

Nos dias 27 e 29 de março ocorreram manifestações de empresários e comerciantes contra o fechamento do comércio6. Os participantes reivindicavam a reabertura das lojas no dia 7 de abril. Em resposta a essas manifestações, o prefeito e a comunidade científica do município divulgaram declarações reforçando a importância das medidas. No dia 30 de março, o prefeito Airton Garcia (PSL) utilizou as redes sociais da prefeitura e a pessoal 7 para transmitir uma mensagem para a população. Pediu união e paciência para enfrentar esse momento difícil, reforçando a importância de escutar os especialistas da área da saúde: “O mundo inteiro achou melhor parar um pouco, não seremos nós de São Carlos que iremos contrariar os técnicos e cientistas. Nós vamos acompanhar essa onda…. Acredito que nesse momento é melhor a gente pecar por excesso do que por falta. Nós precisamos ficar em casa nesse momento. É melhor perder um dia na vida, do que perder a vida em um dia…Quanto mais unidos nós estivermos, mais rápido nós vamos sair dessa situação”.

No dia 31 de março, a comunidade cientifica de São Carlos, representada pela reitora da UFSCar, diretores de instituições de ensino, representantes de órgãos públicos e cientistas, lançou um apelo recomendando fortemente aos governantes do município a manutenção das medidas de isolamento social até, no mínimo, dia 30 de abril, e reforçou a importância de seguir as recomendações da OMS8.

Outra medida adotada pelo governo municipal para o enfrentamento da pandemia foi a compra de 10 mil kits de testes rápidos que permitam mapear e medir a intensidade da doença na cidade 9. Duas outras medidas estão em estudo pelo Poder Executivo: a ampliação de 50 leitos de UTI nos hospitais públicos e a instalação de um hospital de campanha para atendimentos de baixa complexidade.

Na sessão da Câmara do dia 1º de abril, os vereadores decidiram destinar um montante de R$ 1,4 milhão para ações contra o coronavírus10. O valor é a soma do que seria destinado para cirurgias eletivas (que foram canceladas) e das emendas parlamentares. A previsão é de que um projeto seja votado e sancionado na próxima semana. Na atualização do boletim do dia 1º de abril, São Carlos continuava com 2 casos confirmados, 29 casos suspeitos em isolamento, 26 casos suspeitos em internação, 13 casos descartados, 6 óbitos em investigação e 765 casos em isolamento domiciliar (síndrome gripal)11.


5 Os pacientes enquadrados como “síndrome gripal” são orientados a permanecerem em isolamento domiciliar. Todos os casos são incluídos no sistema do município e monitorados.

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