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NEPOL UFJF

Nova Iguaçu: Défict e Enfrentamento

Matheus Vitorino Machado


Mestrando em Ciência Política


Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP/UERJ)


Abrangendo 13 municípios e 3,7 milhões de habitantes, a Baixada Fluminense corresponde a 23% de toda população do Rio de Janeiro1. A despeito de sua magnitude demográfica, a região vive situação de precaridade em seu sistema de saúde. Com apenas três grandes hospitais – Hospital Geral de Nova Iguaçu (Hospital da Posse), Hospital Municipal Moacyr Rodrigues do Carmo e Hospital Estadual Adão Pereira Nunes (Hospital de Saracuruna) -, o sistema de saúde da Baixada Fluminense apresenta déficit de ao menos 7.000 leitos hospitalares².

A junção das insuficiências estruturais do sistema de saúde com a pandemia global de COVID-19 constitui um enorme desafio a ser enfrentado pelo município de Nova Iguaçu. Compondo a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, sendo também a cidade mais antiga da Baixada Fluminense, Nova Iguaçu possui população estimada de 821.128 pessoas³, quarta maior no estado do Rio de Janeiro, com 98,91% de seu contigente habitando espaço urbano e apenas 6,96% acima dos 65 anos4. O índice de desenvolvimento humano municipal de Nova Iguaçu (IDHm) é de 0,713, o posicionando na faixa de desenvolvimento alto, (IDHM entre 0,700 e 0,799), ainda que o 41º no estado5.

Nova Iguaçu ocupa, assim, posição central no fornecimento de serviços diversos para a região da Baixada Fluminense. O sistema de saúde da cidade atende não só seus munícipes, como também os municípios próximos; dados de 2015 indicam que aproximadamente 45% dos pacientes atendidos no Hospital da Posse são oriundos de outros municípios6. Dispõe de 914 leitos para internação em estabelecimentos de saúde, sendo 323 públicos e 591 privados7, o sexto maior em número de leitos no Rio de Janeiro; e um contingente de 2.732 médicos, dos quais 1.562 atendem pelo SUS8. A situação do sistema de saúde iguaçuano rapidamente se provou incapaz de lidar com o avanço da doença; do primeiro caso confirmado de contaminação no município, em 28 de março9, ao dia 31 de março, 80% dos leitos médicos do município encontravam-se ocupados10.

Atualmente chefiando o poder executivo de Nova Iguaçu, encontra-se Rogerio Lisboa (Progressistas), advogado iguaçuano de longa trajetória política. Atuou como vereador por três legislaturas, entre 1992 e 2006, Secretário de Indústria, Comércio e Obras, entre 2005 e 2006, deputado federal em 2007 e Deputado Estadual em 2014, sendo eleito como prefeito de Nova Iguaçu em 201611. Sua carreira política encontra revés em 2019, com a cassação de seu mandato pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RJ) por abuso de poder econômico e Caixa 2. Contudo, a defesa recorreu da decisão, permitindo a permanência de Lisboa no cargo12. Em face da pandemia de COVID-19, Rogerio Lisboa têm mantido presença ativa nas redes sociais, Facebook e Twitter, publicando boletins em vídeo das ações tomadas por sua administração.

Em consonância com o governo estadual, a prefeitura decretou em 13 de março a suspensão das aulas da rede municipal de ensino13, que possui cerca de 65 mil alunos em 141 escolas e creches. Esta ação foi seguida, em 14 de março, da criação de um gabinete de crise, e de decreto proibindo a realização de eventos com grande concentração de pessoas, suspensão de cirurgias eletivas e restrições as visitas a pacientes no Hospital da Posse e Maternidade Municipal Mariana Bulhões14. Os dias seguintes aprofundaram as medidas de enfrentamento ao vírus. Foi determinado estado de emergência da saúde em 18 de março, reduzindo o horário de funcionamento dos setores administrativos15 e a priorização de atendimentos online. A suspensão de consultas ambulatoriais eletivas foi decretada no dia 19 de março16 e, em 21 de março, foi decretado o fechamento do comércio17.

As ações da administração municipal não se limitaram, contudo, à medidas de combate ao coronavírus, estendendo-se também à reorganização de campanhas de saúde. Entre 19 e 21 de março, a Prefeitura de Nova Iguaçu adotou medidas para dar prosseguimento à campanha de vacinação contra o vírus influenza, adiantando seu calendário em conformidade com a decisão do Ministério da Saúde18, e adotando sistema de drive thru para vacinação19. Paralelamente, foi lançada campanha de agendamento de doações de sangue, medida que visa mitigar a queda de 60% das doações de sangue decorrente das medidas de isolamento social20.

Enquanto o pronunciamento presidencial do dia 24 de março teria como tônica o fim das medidas de isolamento social, as medidas tomadas no final de março em Nova Iguaçu acentuariam o isolamento do município e o enfrentamento ao COVID-19. Em 26 de março foi decretada uma série de medidas relativas a transporte público, como a proibição de janelas fechadas em veículos, suspensão do transporte de passageiros em motocicletas, bloqueio da cidade à entrada de veículos do sistema intermunicipal, e limitação do número de pessoas dentro dos ônibus municipais21. No último dia do mês, 31 de março, foi decretado estado de calamidade, decisão tomada após a confirmação de sete casos de coronavírus22. O decreto prorroga as medidas anteriores, dispensa a realização de licitação para compra de materiais e serviços utilizados no combate à pandemia, bem como visa mitigar a lotação de então 80% dos leitos do Hospital da Posse.

Com o risco de colapso do sistema de saúde em vista, a administração de Nova Iguaçu procura expandir a quantidade de leitos para internação através da criação de um hospital de campanha, por meio de uma parceria entre Governo do Estado e Prefeitura. Em 18 de março foi anunciado pela Secretaria Estadual de Saúde a construção de três hospitais de campanha, unidades provisórias providas de equipamentos, médicos e outros profissionais de saúde para atender especificamente pacientes afetados pelo coronavírus23. O antigo aeroclube de Nova Iguaçu irá receber uma destas unidades, gerando expectativa de criação de 200 leitos para o município e região. Até o dia 7 de abril, haviam sido finalizadas as obras de terraplanagem do local24.

Ainda que as medidas tomadas pela prefeitura tenham sido constantes e precisas, a adesão por parte de setores sociais do município tem se mostrado incerta. Mesmo após decreto que determinava fechamento do comércio, estabelecimentos de serviços não essenciais permaneceram abertos25, o que foi seguido por medidas de fiscalização, como instituição de canal de denúncias26. Concomitantemente, denúncias realizadas ao Ministério Público relatavam que igrejas em Nova Iguaçu continuavam promovendo aglomerações de pessoas, infringindo decreto estadual27. Por outro lado, medidas governamentais provocaram efeitos colaterais indesejados, como a dificuldade de acesso ao transporte público, provocando aglomerações28.

Até o dia 7 de Abril, data de escrita deste texto, foram confirmados 38 casos e 2 óbitos, o maior número de casos da baixada fluminense29. Neste sentido, a conjuntura de Nova Iguaçu é crítica, e depende do aprofundamento das políticas de combate ao avanço da pandemia, uma vez que suas políticas afetam parte significativa da baixada fluminense. O município tem demonstrado alinhamento com as diretrizes fornecidas pelo governo estadual, e não dá sinais de recuo.


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