Breno Rodrigo de Messias Leite
Cientista político
Professor do curso de Relações Internacionais da Faculdade La Salle, Manaus
Manaus, capital do estado do Amazonas, possui, segundo os mais recentes dados do IBGE, uma área territorial de 11.401,092 km², com uma população estimada em 2.182.763. Mais da metade da população do estado, calculada em 4.144.597, encontra-se na sua capital. Os indicadores sobre escolarização apontam que 94,2% das crianças de seis e a quatorze anos frequentam a escola. Quanto ao Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), Manaus tem a média de 0,737, sendo que o PIB per capita é de 34.362,71 R$, o maior da região norte(1).
Eleito em 2012 e reeleito no pleito seguinte, na sua segunda passagem pela prefeitura de Manaus, depois de ter sido deputado federal e senador da República, o diplomata de carreira Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto, 74 anos e filiado ao PSDB, é certamente a mais antiga liderança política com mandato. O atual prefeito tornou-se aliado estratégico do governador do estado, Wilson Miranda Lima, e declarou-se, em muitas oportunidades, oposição ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
A primeira ação pública do prefeito Arthur Virgílio no enfrentamento ao COVID-19 data de 29 de janeiro. No Plano de Ação da Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA) estava a preparação e reequipação das Unidades Básicas de Saúde (UBSs). Nas palavras do prefeito, “nosso pessoal vem sendo, cada vez mais, capacitado para combater doenças de avanço rápido, como o sarampo e o H1N1. Atualmente, já contamos com 23 UBSs de referência para o tratamento das Síndromes Gripais e vamos mapear, entre essas unidades, em quais serão estrategicamente centralizados os atendimentos ao novo vírus.”
A Sala de Situação de Vigilância em Saúde da Prefeitura de Manaus, uma espécie de gabinete de crise montado para combater uma crise sanitária de sarampo e H1N1 que atingiu a cidade em 2018 foi recomposta agora para esse novo desafio sanitário de escala global. De acordo com o secretário de saúde, Marcelo Magaldi, uma das primeiramente medidas foi justamente fazer um “georreferenciamento entre as 23 unidades de saúde referenciadas para identificar quantas e em quais serão concentrados esses atendimentos específicos ao novo Coronavírus”. Na oportunidade, o prefeito anunciou a compra de materiais de proteção para os profissionais de saúde e pacientes(2)
QUADRO I – Ações da prefeitura para enfrentar e mitigar os efeitos da pandemia
Em linhas gerais, as falas e ações públicas do prefeito e das autoridades sanitárias do município foram de prudência e cautela em relação à expansão da pandemia. Sem alarmismos, as autoridades buscaram seguir as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde ainda sob o controle do ministro Luiz Henrique Mandetta. A adoção de protocolos internacionais e de recomendações técnicas orientou, até agora, o gerenciamento municipal da pandemia. Tanto o prefeito quanto as autoridades de saúde deram publicidade e transparência de suas ações principalmente nas redes sociais com publicações e lives quase diárias.
Arthur Virgílio tem feito duras críticas ao presidente Jair Bolsonaro em suas redes sociais, principalmente no Twitter, mas também na imprensa nacional e internacional(3). Em sua conta no Twitter cobrou ações do governo federal que dessem condições financeiras para as pessoas ficarem em casa. Se a relação com o presidente da República parece esgarçada, o mesmo não se pode dizer da relação do prefeito com o governador. A cooperação entre os dois poderes é um ponto positivo na estratégia de contenção da pandemia, embora os resultados práticos não tenham sido satisfatórios. A parceria tem como foco a troca de experiências e informações, bem como de profissionais e pacientes (principalmente aqueles que, primeiramente atendidos na rede municipal de saúde, apresentam um quadro mais complicados).
De todas as dificuldades enfrentadas pela administração municipal, certamente três se destacam: primeiramente, a baixa quantidade de leitos e de equipamentos específicos para o atendimento aos acometidos pelo COVID-19, o que demonstra a fragilidade da infraestrutura do sistema de saúde pública(4). Em segundo lugar, o conflito de interesses entre o poder público e o setor produtivo, uma verdadeira queda de braços entre os interesses sanitários e a atividade produtiva, visto que Manaus concentra praticamente 93,8% da riqueza produzida por todo o Amazonas(5). E, por fim, a baixa adesão da população às medidas de isolamento social propostas pelas autoridades sanitárias do estado e do município.
Muito embora os esforços das autoridades públicas tenham sido realizados, os dados daqueles que foram contaminados por COVID-19 no município têm se destacado no país. Dados atualizados dão conta que o Amazonas tem 2044 casos confirmados (clinicamente notificados), sendo que houve um total de 182 mortes, apresentando uma taxa média de 8,9% de letalidade. Já na cidade de Manaus, até agora, foram 1664 casos confirmados, com 167 pacientes internados e 156 óbitos por conta do vírus. Há também forte concentração da contaminação por zona da cidade: alta incidência nas zonas centro-oeste, centro-sul (zonas com pessoas de média e alta renda) e baixa incidência nas zonas norte e leste (zonas com pessoas de média e baixa renda), conforme se vê no mapa abaixo.
Mapa I – Mapa detalha incidência de casos de coronavírus em bairros de Manaus
Fonte: Fundação de Vigilância em Saúde (FVS) do Amazonas, 20206
Apesar dos esforços da prefeitura de Manaus para enfrentar o vírus, os problemas de infraestrutura e a forte demanda (um crescimento exponencial e sem precedentes) comprometeram as iniciativas do governo municipal. As declarações de Arthur Virgílio acerca do colapso da rede municipal e pedido de socorro dos governos estadual e federal desvelam as limitações e entraves que, muitas vezes, o voluntarismo não consegue contornar. E é aí que a realidade se impõe. É possível que variáveis econômicas expliquem a grande concentração de casos em Manaus. A região metropolitana de Manaus, onde se localiza o Polo Industrial de Manaus (PIB), é o espaço de intercâmbio constante com empresas transnacionais asiáticas, especialmente japonesa, coreanas e chinesas. Possivelmente, a lentidão inicial do governo do Amazonas em tomar algumas medidas de isolamento social e de barreiras sanitárias mais severas fez com que o vírus circulasse com mais facilidade pela cidade.
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