Janikelle Bessa Oliveira¹
Departamento de Política e Ciências Sociais
Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes
A pandemia de COVID-19 trouxe a diversos governos no mundo um panorama de crise e, consequentemente, um teste da capacidade dos sistemas de saúde, impondo a necessidade de tomadas de decisão que nem sempre dispuseram – ou dispõem – do aporte adequado de informações para balizar as propostas de ação. O Estado de Minas Gerais(2) contava no dia 23 de abril de 2020 com 1.308 casos confirmados de COVID-19 (casos e óbitos) e 51 óbitos, chegando a 130 municípios com confirmação de casos e 33 com confirmação de óbitos.
O município de Porteirinha não tinha casos confirmados de COVID-19 (23 casos em investigação), até o dia 22 de abril, mas algumas considerações sobre as respostas em nível municipal e o suporte para a organização do distanciamento social envolve impreterivelmente o contexto de sua infraestrutura de saúde e os riscos do aumento de casos em locais com limitações de equipamentos de saúde de média e alta complexidade.
Porteirinha está situada na região do Norte de Minas Gerais, microrregião da Serra Geral. Integra a lista de municípios reconhecidos como pertencentes ao semiárido brasileiro e, consequentemente, da área mineira da SUDENE(3). Conta com uma população estimada em 37.906 habitantes(4) , e com Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM)5 de 0,651.
O poder executivo municipal é ocupado pelo prefeito Silvanei Batista Santos do Partido Socialista Brasileiro (PSB), em seu segundo mandato (2013-2016; 2017-2020). O prefeito também preside o conselho diretor do Consórcio Intermunicipal de Saúde da Rede de Urgência do Norte de Minas (CISRUN), responsável pela gestão do SAMU Macro Norte que contempla oitenta e seis municípios.
A resposta do poder público em Porteirinha ao reconhecimento da pandemia de COVID-19 no país se deu de forma imediata ao decreto6 do Estado de Minas Gerais publicado no dia 15 de março que indicava as medidas de enfrentamento da pandemia no Estado. No dia 16 de março, o Decreto nº 1.408 declarou situação de emergência no município, instituindo o Comitê Extraordinário COVID-19 e suspendendo os eventos agendados.
A suspensão de eventos resultou na paralisação do Festival de Outono que ocorreria no período de 13 de março à 18 de abril. Essa iniciativa para reduzir o potencial de aglomerações foi sucedida da publicação de cinco decretos(7) que normatizaram as diretrizes de distanciamento social de forma progressiva, envolvendo a suspensão de atividades de turismo, de atividades escolares e os cuidados com as atividades com potencial de aglomeração de pessoas (comércio, bares, transporte coletivo).
Em 23 de março foi decretado estado de calamidade pública(8) no município com a ampliação das ações de distanciamento social e a renovação da suspensão das atividades de turismo(9) para todo o mês de abril. No que tange à infraestrutura de saúde, o município tem um Hospital Filantrópico – “Santa Casa e Hospital São Vicente” -, e um total de 30 leitos clínicos/cirúrgicos (Tabela 01), mas não conta com tecnologia para atendimentos de média ou alta complexidade; não há leitos de UTI, nem respiradores.
TABELA 01: Panorama dos equipamentos de saúde na microrregião de Janaúba/Monte Azul
Fonte: CNEs/Datasus(10)
*A cidade de Janaúba conta com dez leitos de UTI adulto e dez leitos de UTI neonatal; ainda conta com quatro leitos de isolamento e dois leitos de cuidados intermediários adulto.
A heterogeneidade da distribuição de infraestrutura de saúde em Minas Gerais busca compensação na sua política de regionalização, em que, através do Plano Diretor de Regionalização(11) (PDR) é desenvolvido o planejamento territorial de saúde com base no cálculo das necessidades e alocação de recursos. O Estado é dividido em macrorregiões e microrregiões de saúde, com a atenção primária presente em todos os municípios, a concentração de unidades secundárias de média complexidade instaladas em municípios referência das microrregiões e as unidades terciárias de alta complexidade instaladas em municípios de referência das macrorregiões.
Porteirinha está inserida na Macrorregião Norte – Montes Claros – que comporta nove microrregiões de saúde (Brasília de Minas/São Francisco; Coração de Jesus; Francisco Sá; Janaúba/Monte Azul; Januária; Manga; Montes Claros/Bocaiúva; Pirapora; Salinas/Taiobeiras). E no âmbito da microrregião de saúde, está localizada na de Janaúba/Monte Azul, abrangendo quinze municípios (Matias Cardoso; Espinosa; Gameleiras; Mamonas; Monte; Catuti; Mato Verde; Pai Pedro; Verdelândia; Porteirinha; Nova Porteirinha; Serranópolis De Minas; Janaúba; Riacho Dos Machados).
O município de Janaúba – como referência da microrregião – concentra os equipamentos de saúde para atendimento de média complexidade, e consequentemente é onde se encontra os vinte leitos de UTI (dez leitos adulto e dez leitos neonatal) e 25 do total de 26 respiradores (Tabela 01), para atender a uma população estimada em 278.394 mil habitantes da microrregião de saúde.
A cooperação entre os municípios é fundamental para certas demandas de atendimentos (maior complexidade), principalmente, na condição da microrregião de Janaúba, que apresenta dez municípios que não têm sequer leitos hospitalares e um total de vinte e seis respiradores. A hipótese de sobrecarga de microrregiões engendra a necessidade de encaminhamento dos casos para os municípios referência das Macrorregiões, o que no caso de Porteirinha seria para Montes Claros.
O decreto de nº 1.424 de 7 de abril(12) apresenta um relaxamento do distanciamento social com a possibilidade de reabertura de atividades que não tem capacidade de aglomeração de pessoas (reuniões religiosas, eventos); as atividades de serviços e comércio podem funcionar atentando para a assepsia e a limitação do atendimento ao público.
A reabertura do comércio segue pautada na inexistência de casos confirmados de COVID-19 no município, seguindo uma tendência de relaxamento do distanciamento no nível federal e mais recentemente estadual. O processo de reabertura do comércio atrelado com a baixa capacidade de testagem de COVID-19 no país é mais um cenário a ser acompanhado pelos governos em seus três níveis (federal, estadual e municipal). Nesse sentido, torna-se basilar o acompanhamento das informações da condição e taxa de ocupação dos leitos hospitalares, de UTI e da capacidade de uso dos equipamentos de saúde necessários
1Professora do Departamento de Política e Ciências Sociais da Universidade Estadual de Montes Claros – Unimontes; Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da UnB.Boletim Epidemiológico da Secretaria de Saúde de Minas Gerais. Acessado em: 23/04/2020.
2https://saude.mg.gov.br/images/noticias_e_eventos/000_2020/Boletins_Corona/23.04.2020_Boletim_epidemiologico_COVID-19_MG.pdf.
3Informação disponível em: http://www.sudene.gov.br/images/arquivos/semiarido/arquivos/Rela%C3%A7%C3%A3o_de_Munic%C3%ADpios_Semi%C3%A1rido.pdf.
4IBGE cidades, endereço eletrônico: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/mg/porteirinha/panorama. Acessado em: 20/04/2020.
5Endereço eletrônico: http://atlasbrasil.org.br/2013/pt/perfil_m/porteirinha_mg
6Decreto nº 47.886 de 15 de março de 2020. Acessado em: 22/04/2020. Endereço: https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=391035.
7Decretos: nº 1.409 de 18 de março de 2020; nº 1.410 de 19 de março; nº 1.412 de 20 de março; 1.413 de 20 de março; nº 1.414 de 21 de março. Endereço: https://porteirinha.mg.gov.br/
8Decreto nº 1.415 de 23 de março de 2020. Endereço: https://porteirinha.mg.gov.br/
9Decretos nº 1.418 de 31 de março de 2020; nº 1.419 de 31 de março de 2020 e nº 1.420 de 1 de abril de 2020. Endereço: https://porteirinha.mg.gov.br/
10Dados disponíveis no endereço http://cnes2.datasus.gov.br/Index.asp?home=1. Acessado em: 20/04/2020.
11Plano Diretor de Regionalização da saúde. Endereço eletrônico https://saude.mg.gov.br/images/noticias_e_eventos/000_2016/Livro%20Plano%20Diretor%20de%20ReRegionaliz%20-%20PDR-SUS-MG.pdf. Acessado: 20/04/2020.
12O decreto de nº 1.424 de sete de abril de 2020. Endereço: https://porteirinha.mg.gov.br/
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