Karime Lima
Mestranda em Ciência Política
Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP/UERJ)
A Região dos Lagos é composta por nove municípios dentre os quais Cabo Frio possui destaque devido à sua importância econômica e concentração de serviços. Localizado a aproximadamente 150 km da capital do Rio de Janeiro, Cabo Frio é o município mais populoso da região, contando com uma população estimada pelo IBGE em 226.525 pessoas. O município possui Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) 0,735 e PIB per capita de R$ 39.781,41(1) Além da grande vocação turística e industrial, Cabo Frio ocupa a décima colocação da lista de municípios brasileiros que mais arrecadam com royalties de petróleo(2) e esta arrecadação representa a principal receita do município.
O prefeito em exercício é o médico Adriano Moreno (REDE), conhecido como Dr. Adriano, eleito no primeiro turno das eleições municipais de 2016. A eleição foi definida após decisão judicial em decorrência do indeferimento da candidatura do ex-prefeito e também médico Marcos Mendes (MDB), conhecido popularmente como Marquinho Mendes, que obteve a maioria dos votos. A primeira normativa municipal de enfrentamento à Covid-19 foi o Decreto 6.202 de 13/03 que dispôs sobre a consideração do isolamento e da quarentena, as medidas de prevenção ao novo coronavírus e a suspensão de eventos em locais públicos. Antes mesmo do anúncio da quarentena na capital e no estado, o governo municipal cabo-friense já havia anunciado que considerava tal medida com base na expectativa da secretaria estadual de saúde do aumento significativo de casos.
A Região dos Lagos entrou para a lista de casos suspeitos de Covid-19 na primeira semana de março com a divulgação de um caso suspeito em São Pedro da Aldeia. Em Cabo Frio, o primeiro caso confirmado foi divulgado dia 07/04. O município decretou estado de calamidade pública no dia 09/04(3) , quando contava com três casos confirmados, em consonância com as situações de emergência em saúde pública nos âmbitos nacional e estadual. A região possui um baixo quantitativo de leitos em comparação com a média estadual e, de acordo com o DATASUS, Cabo Frio possui 75 leitos de UTI, estando 15 na rede SUS. Cabo Frio, juntamente à Araruama, concentra estabelecimentos de saúde com capacidade de procedimentos de média e alta complexidade. Dessa forma, a falta de hospitais e clínicas especializadas sobrecarregam os dois maiores municípios da região.
A principal iniciativa municipal até então foi o arrendamento do Hospital Unilagos para atuar como unidade de referência contra a Covid-19 e seu uso é exclusivo para casos confirmados da doença. O hospital foi inaugurado dia 10/04 e conta com 60 leitos de internação e 21 leitos de UTI. Contudo, o hospital é alvo de críticas por parte da associação médica de Cabo Frio e por outras categorias que têm pressionado a Prefeitura por maior transparência dos gastos com a unidade. Além disso, denúncias anônimas feitas à imprensa local por profissionais de saúde da unidade relatam que a secretaria de saúde não tem fornecido Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) suficientes aos profissionais.
A falta de infraestrutura e de equipamentos básicos teria ocasionado a transferência de um paciente de Cabo Frio para o Hospital Ronaldo Gazolla, referência no atendimento à Covid-19 em Acari, na capital Rio de Janeiro. O secretário de saúde admitiu que irá transferir pacientes para outras unidades estaduais enquanto for possível de modo a evitar que a unidade municipal atinja sua capacidade máxima(4). O município sofre ainda com a insuficiência no número de profissionais de saúde devido, entre outras coisas, aos constantes atrasos nos salários desses profissionais.
A situação da saúde em Cabo Frio era considerada ruim mesmo antes da pandemia. Vivendo uma “crise dentro da crise”, Cabo Frio trocou de secretário de saúde quatro vezes e a indicação do atual secretário foi feita em articulação com o governo estadual. Essa indicação é proveniente da aproximação do prefeito Adriano Moreno (REDE) e do governador Wilson Witzel (PSC)(5). No entanto, a atual gestão da secretaria é criticada em virtude do perfil do secretário – ex-deputado estadual e policial reformado – que é considerado “rígido” e de desgastes ocasionados pela liberação de funcionários da saúde considerados de grupos de risco(6). Sob a atual gestão, também houve repercussões negativas após a tentativa de terceirização da rede municipal de saúde, que foi revogada pela Câmara em fevereiro.
Apesar do protagonismo do Executivo municipal na gestão da crise de Covid-19, o Legislativo municipal e o Ministério Público do Estado do Rio de janeiro (MPRJ) têm atuado conjuntamente. O MPRJ expediu, em 30/03, recomendação aos prefeitos e aos secretários municipais de saúde de Cabo Frio, Arraial do Cabo e Armação dos Búzios para adoção de medidas restritivas coletivas e intermunicipais, com foco na cooperação e no intercâmbio de informações e dados e na unidade de ações baseadas em parâmetros técnicos(7). Já a Câmara dos Vereadores de Cabo Frio aprovou um pacote de leis de suporte à crise econômica e anunciou a devolução mensal de R$ 200 mil para a Prefeitura comprar cestas básicas e distribuir entre as famílias mais vulneráveis em 15/04(8).
No dia 17/04, o prefeito Adriano Moreno (REDE) foi afastado após a confirmação de que ele teria contraído coronavírus e continuou presidindo o Gabinete de Gestão de Crise em isolamento domiciliar. Além dele, o secretário de desenvolvimento econômico também foi afastado por conta da doença.
Assim como em outros municípios, a vacinação em massa contra a Influenza, a sanitização das vias públicas e a instalação de barreiras sanitárias que visam impedir o acesso dos não-residentes também foram medidas tomadas pela Prefeitura cabo-friense. O fechamento de hotéis, pousadas e das praias gerou incômodos no setor hoteleiro e em parte da população. No dia 22/04, a Prefeitura publicou o Decreto 6.236 que determina o uso obrigatório de máscaras nas ruas e nos estabelecimentos de Cabo Frio. Esta medida pode ser encarada como uma resposta às carreatas desfavoráveis às medidas adotadas e ao pedido da Associação Comercial, Industrial e Turística de Cabo Frio (Acia) pela abertura do comércio local.
A situação da capital Rio de Janeiro e de outras regiões próximas mais afetadas fez com que os municípios da Região dos Lagos tomassem precauções devido ao grande trânsito de pessoas para a região nos finais de semana e nos feriados, por ser uma região praiana, de modo a se anteciparem a um eventual colapso do sistema de saúde. Conclui-se, portanto, que a pouca capacidade do sistema de saúde cabo-friense de atender uma demanda generalizada de outros municípios da região que não contam com sistema de saúde bem estabelecido, bem como a proximidade à secretaria estadual de saúde e ao governo estadual, tenham motivado a tomada de medidas restritivas antecipadamente e o relativo controle epidemiológico. Cabo Frio possui 24 casos confirmados e 3 óbitos decorrentes de Covid-19 até o presente momento (27/04) e prorrogou até 30/04 as medidas de prevenção ao contágio e de enfrentamento à Covid-19
2https://plantaodoslagos.com.br/categoria/cidades/cabo-frio-nao-presta-contas-de-quanto-investe-com-os-royalties-que-recebe/
3https://g1.globo.com/rj/regiao-dos-lagos/noticia/2020/04/09/com-3-casos-de-coronavirus-confirmados-cabo-frio-decreta-estado-de-calamidade-publica.ghtml
4https://www.folhadoslagos.com/geral/secretario-de-saude-admite-recorrer-a-transferencias-para-evitar/13101/
6https://www.folhadoslagos.com/geral/coronavirus-saude-de-cabo-frio-vive-crise-dentro-da-crise/13135/
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