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Bauru (SP) e as estratégias de enfrentamento ao Covid-19: avanços, retrocessos e dificuldades

Bruno Vicente Lippe Pasquarelli

Doutor em Ciência Política pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)Professor do curso de Relações InternacionaisCentro Universitário Sagrado Coração



Localizada no Centro-Oeste do Estado de São Paulo, Bauru cresceu durante a expansão da economia cafeeira, na década de 1920, se tornando um importante entroncamento ferroviário e uma cidade com grande crescimento urbano-industrial e econômico. Porém, com a crise de 1929, a cafeicultura foi aos poucos perdendo força, cedendo espaço para outras formas de agricultura, como o algodão. Já na segunda metade do século XX, Bauru passou a ser um município muito dependente do setor de comércio e serviços, atualmente os maiores geradores do PIB da cidade.


De acordo com os dados da Fundação Seade(1) , Bauru, que atualmente é governada pelo Prefeito Clodoaldo Armando Gazzetta (que no início de 2020 migrou do PSD para o PSDB), é a 18º maior cidade do Estado de São Paulo e a 65º maior do país, perfazendo um total de 364 mil habitantes. Com salário médio mensal de 2.8 salários mínimos, o município possui um Índice de Densenvolvimento (IDH) de 0,801, considerado muito alto.


Na área da saúde, todos os hospitais da cidade que atendem pelo SUS são do governo Estadual, e não do município. Ressalta-se ainda que Bauru possui 1.228 leitos de internação, sendo uma proporção de 1,76 leitos por mil/habitantes, índice superior ao Estado de São Paulo, que possui 1,18 leitos por mil/habitantes. Até o dia 5 de maio, Bauru possuía 123 casos confirmados de COVID-19, com 40 suspeitos. Dos 123 casos positivos, segundo o informe epidemiológico nº49, houve 7 óbitos.


A primeira medida realizada pelo prefeito do município foi após a Organização Mundial da Saúde classificar o coronavírus como pandemia, em 11 de março. Logo após, a prefeitura Municipal de Bauru, por meio do Decreto nº 14.656 de 16 de março, passou a estabelecer as medidas de enfrentamento e precaução contra a doença. Dentre as principais medidas, foi estabelecido o recesso escolar antecipado (com posterior fechamento, em decreto do dia 18 de março), a adoção do teletrabalho da administração pública direta e indireta e a suspensão dos eventos com aglomerações de pessoas. Além disso, foi feita uma recomendação às empresas privadas, estabelecendo que as mesmas deveriam utilizar medidas para conter a disseminação da pandemia, evitando, por exemplo, a aglomeração de pessoas(2).


Já em 20 de março, o Decreto nº 14.664 estipulou situação de emergência no município. Com validade de seis meses, o texto do decreto proibiu o funcionamento, por 30 dias, de todos os estabelecimentos comerciais e de serviços que tenham acesso direto ao público ou que possam gerar aglomeração de pessoas. Além disso, o decreto criou exceções (os chamados serviços essenciais), tais como postos de combustíveis, farmácias, serviços médicos, supermercados, feiras livres, dentre outros. Destaca-se também que o decreto estabeleceu que a prefeitura poderia contratar, de forma temporária e sem realização de serviço público, médicos e demais profissionais de saúde. Por fim, proibiu, pelo prazo de 30 dias, a realização de eventos públicos e privados em que ocorra a aglomeração de pessoas(3).


No dia 29 de março, um dia após a confirmação do primeiro caso de Coronavírus no município(4) e cinco dias após o pronunciamento de Bolsonaro em rede nacional (no qual o presidente desdenhou da doença e da aplicação de medidas de contenção social), a Prefeitura emitiu o decreto nº 14.694(5), que determinou a quarenta no município até o dia 7 de abril, vedando a realização de quaisquer eventos ou manifestações que tenham aglomeração de pessoas ou que possam comprometer e colocar em risco a saúde da população(6). No mesmo dia, foi declarado “estado de calamidade pública” por meio do decreto nº 14.695(7).


Em depoimento(8) , o prefeito reforçou a importância do processo de enfrentamento da epidemia na cidade de Bauru, sendo necessário ter a consciência de que passamos por um momento gravíssimo da história do país, onde é primordial que as pessoas fiquem em casa até o final da quarentena recomendada pelo governo do Estado e pela prefeitura de Bauru. Como vemos, além da defesa do isolamento social, há uma clara adesão do prefeito de Bauru às medidas tomadas pelo governador João Doria, também do PSDB, com posicionamentos que convergem com os do Estado.


Pode-se notar duas evoluções em relação ao sistema de saúde do município. Em primeiro lugar, foi aberta uma Unidade Regional do Instituto Adolfo Lutz, o que permitiu maior agilidade e rapidez nas testagens – apesar de que, tais testagens financiadas pelo Estado contemplam apenas pacientes internados com quadro mais grave da doença, além de trabalhadores da saúde sintomáticos afastados em razão da suspeita9 . Em segundo lugar, será feita a abertura de 40 leitos de média complexidade como retaguarda para o Hospital Estadual de Bauru – que terá 27 novos leitos de tratamento intensivo para auxiliar na demanda de atendimentos durante a pandemia(10).


Porém, apesar das medidas tomadas visando o isolamento social, do bom relacionamento com o governo do Estado e da construção de novos leitos e da possibilidade de testagens mais rápidas, há uma grande dificuldade de parte da população em cumpri-las. De acordo com os dados do Monitoramento Inteligente do Governo do Estado de São Paulo, a taxa de isolamento em Bauru tem caído consideravelmente, chegando a atingir 41% nas últimas semanas. De 21 de março a 7 de abril, os patamares de isolamento estavam em torno de 50%. Porém, de acordo com o Prefeito Clodoaldo Gazetta, desde então, devido à polarização política entre os poderes, diversos indivíduos decidiram flexibilizar o isolamento. Gazetta ainda reiterou que “é difícil ficar em casa, mas a população precisa nos ajudar. O isolamento é fator condicionante para que a flexibilização aconteça”. Ainda, de acordo com o prefeito, “há a possibilidade de a quarentena ser até postergada e sem flexibilizações, se a avaliação da cidade não for boa e a curva de infectados aumentar muito”(11).


Bauru é uma cidade totalmente dependente do setor de serviços e do comércio. Com isso, o Sindicato do Comércio Varejista de Bauru e região (Sincomércio) se colocou em conflito direto com o Poder Público ao entrar com uma ação no Poder Judiciário pedindo a reabertura das lojas. Após a realização de diversas carreatas pró-abertura comercial, segundo o presidente do Sindicato, Walace Garroux, mais de 10 mil empresas do setor comercial estão sendo prejudicadas, com 38 mil empregos sendo afetados. Ainda de acordo com Garroux, se a quarentena persistir, até o final de maio 20% das empresas irão desaparecer, com 7 mil novos desempregados(12). Porém, a justiça negou a reabertura das lojas e ressaltou a necessidade2 de medidas de distanciamento social. Segundo a juíza Ana Graça Lima Aiello, “não deve o Prefeito afastar-se das diretrizes estabelecidas pelo Estado de São Paulo, sob pena de violação ao pacto federativo, colocando em risco os direitos fundamentais à saúde e à vida”(13).


Outro ponto negativo das estratégias de enfrentamento ao COVID-19 tem sido a centralização do Poder Executivo na tomada de decisões e até na blindagem de informações aos vereadores. Pode-se averiguar um certo descompasso das relações entre Executivo e Legislativo, visto que o presidente da Casa, José Roberto Segalla (DEM) tem defendido que o governo precisa dialogar mais com o Poder legislativo e com a própria sociedade civil, ampliando o leque de especialistas, pesquisadores e setores consultados. Para a vereadora Telma Gobbi (PP), há dificuldade em estabelecer um cronograma sobre a retomada gradual e responsável das atividades econômico-comerciais do município(14).


Por fim, ressalta-se a pouca atenção destinada a áreas carentes e às favelas do município, sendo que as poucas ações realizadas estão relacionadas à distribuição de cestas básicas – que, de acordo com a Câmara dos Vereadores da cidade, tem sido pouco eficiente(15). Há a pretensão do uso de verbas de fundos municipais para a saúde e assistência social, porém ainda não foi detalhado como será realizado tal procedimento.



 

6 Tal medida foi prorrogada em 7 de abril, por meio do decreto nº 14.712 (https://www2.bauru.sp.gov.br/arquivos/sist_juridico/documentos//Decretos//dec14712.pdf) e em 22 de abril, via decreto nº 14.735 (https://www2.bauru.sp.gov.br/arquivos/sist_juridico/documentos//Decretos//dec14735.pdf) que está em vigor até o dia 10 de maio.

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